Monday, November 20, 2006

A Morte, Novamente...

(Fancis Bacon, "Head VI", 1949)

O Tomy foi à produtora na segunda-feira passada. Veio pedir conselhos profissionais, indicações de contatos, precisava de emprego. Chegou munido de um laconismo quase impenetrável e uma irritação sutil de quem já perdeu a paciência com as esperas da vida. Eu senti urgência em ajudá-lo, tracei um plano de prospecção para ele, fiquei ao telefone mais de uma hora em ligações de apresentação. Coisa que eu não faço normalmente. É claro que o Tomy não era qualquer um, era o irmão do Dudu, casado com a irmã da mulher de meu irmão. O Dudu eu conheço bem, boa-praça, dedicado companheiro de uísque nas festas de família, dono de um coração gigante e sabedor de umas histórias de fazenda, caçada e pescaria que ele sempre repete todas as vezes que sentamos para beber, mas que eu sempre ouço com interesse.

O Tomy, não. Sujeito quieto, fazedor de vídeos, fez um documentário sobre samba. Era tudo que eu sabia dele. Talvez por isso não tenha valorizado a sensação de vazio que ele me transmitiu. Não era nada de objetivo. Na verdade, se eu fosse realmente avaliar seu humor naquele dia, diria que estava normal. Falou articuladamente, estava bem vestido, tinha vindo ao meu encontro por iniciativa própria. Mas comunicava um vazio, de alguma forma. Eu não sentia vontade de falar com ele, algo nele me dava medo de mim mesmo. Mas isso são percepções retrospectivas; pode ser que hoje eu pense dessa maneira somente por saber o que aconteceu depois.

Saiu da produtora com uma lista de pessoas para ligar, já avisadas de que ligaria. No dia seguinte, mandou-me o seguinte email:

Dimi,

Já consegui falar com algumas pessoas.

A Maristela foi muito simpática. Estou levando meu filme para ela dar uma
olhada.

Te ligo quando tiver novidades.

Abraço

Tomy


Não parece um texto de alguém prestes a se matar.

Quatro dias depois, ontem, minha cunhada Rafaela ligou avisando que estava sendo velado no cemitério do Morumbi. Enforcou-se com o cabo da tv.

***

Há aproximadamente 10 anos, meu ex-cunhado Lúcio enforcou-se com o cordão da capoeira. Há uns tantos anos, aproximadamente na mesma época, meu colega de medicina Popi matou-se com uma overdose de barbitúricos e minha colega de medicina Ieda matou-se com uma injeção de potássio. Quando eu ainda morava em Boston, em 1994, o namorado da Rebecca, Rafaello, pulou do prédio onde morava (então descobrimos que ele era o rei da Itália, estudando incógnito na Harvard, todos os papparazzi do mundo apareceram ao mesmo tempo).

Não vou falar sobre o desespero, sobre a depressão, sobre a desistência. Mas sim sobre o que esses casos tinham em comum: todas essas vítimas, além de serem os únicos suicidas que conheci pessoalmente, estavam sob o efeito de anti-depressivos modernos, de uma classe chamada SSRI, inibidores seletivos da recaptação de serotonina. Prozac, Zoloft, Paxil, esses, entre outros.

Se você fizer uma busca ligeira no Google, utilizando as palavras-chave "Prozac, Zoloft, Suicide", aprende rapidamente que a correlação entre essas drogas e um aumento na taxa de suicídio não é novidade. Alguns estudos apontam uma incidência de quase 4% de suicídios entre os pacientes que utilizam esse tipo de droga, contra 0,2 a 0,8% entre os que utilizam outros antidepressivos. Existem milhares de processos na justiça americana contra os laboratórios que os fabricam, todos por responsabilidade em suicídios. Há vários estudos clínicos associando estes antidepressivos a efeitos colaterais como irritação, mania, agressividade, auto-agressões e outros. Algumas crianças sob o efeito dessas drogas exibem um comportamento estereotipado de estapear o próprio rosto.

Li o relato de um caso em que os pais descrevem os últimos dias de vida de sua filha de 16 anos. Ela estava ansiosa em relação a um namoro. Após uma consulta de 30 minutos, um terapeuta indicou receitou 25 mg de Zoloft. Alguns dias depois, ela se internou voluntariamente, por não se sentir segura com a droga. Na internação, aumentaram sua dose para 150 mg diárias. Ela se enforcou no terceiro dia de alta.

Nos EUA, hoje as embalagens dessas drogas vêm com um aviso numa moldura negra, avisando quanto ao maior risco de suicídio. Aqui, nunca vi ninguém falar nada a respeito.

Friday, November 10, 2006



Noite de Pré- Estréia


Acabei de ver "Canta Maria", com trilha de minha modesta autoria. Depois de mais de um ano no processo, essa foi a primeira vez que eu consegui assistir ao filme sem ter que avaliar coisas ou tomar decisões. Surpresa: gostei do filme!

Fazer música para um longa-metragem é o exato oposto de fazer música para um comercial de televisão. Fazer um disco fica no meio do caminho. O comercial de televisão é uma raspadinha, uma loteria instantânea em que é muito rápido você saber se acertou ou errou. A sua recompensa é imediata: a aprovação, o dinheiro no banco. Se errar, também é rápido ver o efeito: os clientes gritando, o atendimento gritando, os criativos gritando, o diretor do filme gritando; você acuado num canto da sala, vendo sua carreira ir pelo ralo, decidindo finalmente ir vender artesanato na escadaria da Gazeta. Ou dar aula de guitarra. Quando você faz um longa, é o oposto, não é loteria: é um processo lento e doloroso, que lembra mais um plano de carreira. A coisa demora muito a fazer sentido. É tudo lento e fragmentado, demora a tomar forma, principalmente no Brasil, onde o dinheiro acaba no começo, no meio e no fim do processo. Quando está compondo e produzindo, você vê o filme umas 457 vezes, mas aos pedacinhos. Você vê ele inteiro na mixagem, e ainda tá preocupado em ver se não tem nada errado, e acaba não podendo ver se tem algo certo. Quando sai a cópia, vc vai assistir de novo, mas sua cabeça ainda tá fragmentada, você mal entende a história. Está ainda preocupado se a emenda da música vai passar de um rolo para o outro, se a música não está muito alta, se você não deveria ter limado aquele trecho, se não deveria ter escrito música para aquela cena que tá seca...

Hoje fazia uns 6 meses que não via a bagaça. E deu pra entender o filme, talvez pela primeira vez, e até que eu gostei da música.

Quem estiver a fim de assistir, veja o site: www.cantamariaofilme.com.br

Wednesday, November 08, 2006


Baby, I'm back!!!!!!

Agradeço aos meu leitores sobreviventes pela paciência. Algo da minha ausência está explicado no texto que transcrevo abaixo, publicado anteriormente no blog d'Os Improváveis.

osimprovaveis.blogspot.com/


06 Novembro 2006

pqp, mais um blog!!!

a banda nao se responsabiliza pelos posts assinados pel"os improvaveis".
mas agradece
a gentileza
e a presteza
em informar
nosso delicado publico.

Eu não tenho dado conta nem do meu blog pessoal, na verdade. Há meses que ele tá lá, paradão... me olhando feio. Os meus ex-leitores agora só me deixam mensagens de xingamento e maldição. Mas isso é amor. Pior seria se me xingassem enquanto em atividade. Alguns xingavam. Mas eu deletava. Minha auto-estima tem limite.

Acho que parei quando descobri que estava ficando surdo do ouvido direito. Se a coisa progredir, eu paro de tocar o baixo na banda. Faço umas coreografias, sei lá. Se me xingarem, pelo menos não vou ouvir. Mas, até aí, o Eric Clapton também tá com um zumbido no ouvido, e perdendo a audição. O beethoven do blues. Tocando as pentatônicas por instrumento, fazendo vôo surdo. Acho legal quem toca a vida toda uma mesma coisa, tem coerência estilística. Eu nunca tive paciência pra me filiar a um estilo só, sou uma puta musical, vou com todos. Acho chique, isso do Clapton ralar Cocaine e Layla até hoje. Eu tenho uns discos do Cream, do final dos anos 60, em que o Clapton já tinha esse som dele, e dizem que em Londres tinha uma série de pichações dizendo "Clapton is God". Mesmo que tenha sido o empresário dele quem pichou, tem que ter a moral pra encarar o papel. Deus! Mas o ponto é que o cara vem com o mesmo som desde essa época, refinando o fraseado, polindo os bends, caprichando nos vibratos... puta saco. Mas admiro.

Eu não nasci assim. Nasci prostituto, como já disse. E essa banda improvável também é cheia de meretrizes, tão biscates quanto eu. As meninas, nem tanto. Casadinhas, boas moças. Falo metaforicamente, musicalmente prostituídos. Assim que é bom, namorar com todos os estilos, sem nojinhos. Pelo menos, ninguém faz pose de santo paladino, enquanto baba no saco dos executivos de gravadora e do Faustão. E olha que temos potencial! Dizem que, com uma boa estratégia de marketing, em poucos meses estaríamos em condições de babar no saco do Faustão. Há quem goste, tô fora!

O objetivo da banda não é esse. O objetivo da banda é falar merda em público. Chamar alguma atenção para poder dar declarações politicamente incorretas em programas de entrevista. Ir no Ronnie Von e mandá-lo tomar no cu.